O corpo é nossa conexão com o mundo. É frente aos estímulos e por meio das sensações corpóreas que temos a consciência de nós mesmos.
Essa vivência ocorre quando olhamos para um espelho, ou quando enxergamos o que está à nossa volta ocorrendo à experiência extracorpórea.
Uma experiência de nós próprios pode ocorrer também através das sensações proprioceptivas, sejam elas de prazer ou de dor.
A dor ou um sistema corpóreo sempre nos atrai para a consciência de nós mesmos, pois frente à doença é mais difícil negar nossa estrutura corpórea. A dor é autorreferente, nos chama a atenção para o corpo e suas características e formas.
O toque de outra pessoa ou o contato com um objeto extracorpóreo nos faz lembrar que somos existentes, independentes do outro, do objeto exterior.
Nossos órgãos sensoriais captam, organizam e codificam em informação corpórea o universo que nos rodeia (odores, texturas, formas, distância, gostos).
Portanto, a imagem do corpo estrutura-se por meio do contato do indivíduo consigo mesmo e com o mundo que o cerca, e em sua constituição entram contribuições anatômicas, neurológicas, fisiológicas, sociológicas e psicológicas.
Através das informações dos órgãos dos sentidos, nossas ideias e atos psíquicos são formados com a finalidade de proteção aos diversos estímulos que se apresentam, como os perigos que nos ameaçam, desenvolvendo a distinção entre o reconfortante e o ameaçador, e permitindo reações voluntárias e involuntárias.
Essas impressões podem ser transcodificadas cerebralmente em sensações especiais: visuais, auditivas, olfativas, gustativas e táteis.
O corpo social
A imagem corpórea também é influenciada pelo contexto e os condicionamentos sociais. É fato que os valores de cada comunidade, de cada povo e cada época interferem no valor que se dá ao formato do corpo. Exemplos: em comunidades rurais, tem-se como ideal a mulher forte e boa reprodutora; na cidade, a imagem valorizada da mulher é de corpo delgado, magra e esbelta.
As crenças pessoais, o imaginário e o ideal de ego vão determinar muitos aspectos na leitura e interpretação do próprio corpo (aceitação, revolta), e também a modelagem deste corpo.
A imagem e percepção corpórea acontecem na experiência e interação de nosso desenvolvimento biológico e psicológico. As posturas e modelos se modificam constantemente a partir das emoções e sensações que nos sãos proporcionados de acordo com os estímulos que recebemos, se são reforçados ou não.
As impressões de nossos sentidos oferecem motivos para desenvolver toda nossa faculdade de conhecer e constituir experiências; as interações entre consciência e instinto modulam e delineiam essas constituições.
Somos condicionados pela crença de que o nosso corpo é só o que temos para oferecer em um jogo de conquista. Cada vez mais os padrões são rígidos e inflexíveis, o que coloca a praticamente todos dentro do padrão de inadequação e desvalia.
Hoje a aparência jovem é sinônimo de prosperidade e status social.
Vale salientar que esse padrão que desvalia, e toda pressão pessoal e social para ter o corpo dentro dos padrões normatizados como ideal, influência inclusive no processo do adoecer, afinal age diretamente no psíquico gerando desconfortos e autoimagem negativa. Sentir-se inadequado, não aceito e não desejado amplia e favorece o desenvolvimento dos transtornos não só psicológicos como físicos.
O maior tabu
Podemos pensar em vários tabus que compõem uma sociedade, mas nenhum deles é tão forte e profundo como o nosso corpo. Ele é objeto de conceitos e preconceitos intensos em todas as sociedades, independente da época histórica, do continente, da cultura, da crença religiosa etc.
Nosso corpo é tabu para nós mesmos e para nosso meio social.
Ao corpo são atribuídos adjetivos pejorativos tais como: sujo, impuro, fraco, não confiável, perigoso.
Constantemente ouvimos sobre rituais de purificação e até mesmo de mortificação (acoites, crucificação), mas também identificamos formas mais brandas de punições no nosso dia a dia. (os jejuns como forma de sacrifício)
O que devemos entender, e identificar, é que como somos “travados” quando estamos nos relacionando corporalmente. Temos dificuldades que nem nós mesmos entendemos e desconfortos ao toque que não sabemos explicar. Esses fatos, ou melhor, “esse meu jeito de ser”, nada mais é que fruto de um processo de castração e recolhimento de toda uma vida.
Anderson Zenidarci
Psicólogo Clínico, Mestre em Psicologia da Saúde, Coordenador e Professor de Pós-Graduação em Psicossomática e Transtornos e Patologias Psíquicas, Supervisor Clinico, Pesquisador, Colunista da revista Psique: Ciência e Vida, Autor de dois livros sobre psicologia: 99 Procedimentos facilitadores em processos psicoterápicos e Adoeci! Por quê?
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